Resenhas


ABREU, Regina; CHAGAS, Mário (orgs.). Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos. 2ª Ed. – Rio de Janeiro: Lamparina, 2009. [1]
CARVALHO, Tamiris[2]
ROSSI, Daiane Silveira²

O livro “Memória e patrimônio: ensaios contemporâneos” que será resenhado subdividem-se em cinco blocos temáticos: I- Patrimônio, natureza e cultura; II- Memória e narrativas nacionais; III- Memória e narrativas urbanas; IV- Memória e etnicidade; V- Memória e reflexidade. Os artigos que compõem os eixos temáticos são frutos de seminários do Programa de Pós- graduação em Memória Social (PPGMS) e do Centro de Ciências Humanas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio); de reuniões da Associação Nacional de Pós- Graduação em Ciências Sociais e da aula inaugural do PPGMS do ano de 2000. Atualmente na sua 2ª edição, publicada em 2009, esta obra merece destaque por propor novos olhares para a relação entre natureza e cultura, propiciando a compreensão entre patrimônio e memória como uma construção que se faz a partir do intangível.   
Em “Patrimônio, natureza e cultura”, primeiramente o autor José Reginaldo Gonçalves aborda o que é patrimônio, onde a noção do mesmo se confunde com bens móveis, no entanto, considera-se a música, a dança, culinária, ou seja, bens imateriais também como patrimônio. Em seguida temos o artigo de Regina Abreu onde a autora procurou destacar o histórico da noção de patrimonial no mundo e salienta os debates atuais a respeito de patrimônio genético, através da biodiversidade. Márcia Sant Anna também aborda o histórico do patrimônio, porém tratando-se de Brasil, através da concepção  andradianas. Ainda tratando-se de patrimônio cultural brasileiro, Maria Cecília Londres Fonseca az um retrospecto do sentido que os monumentos expressam na população, a maneira extra textual com que eles os atingem, ou seja, o processo histórico que representam. Rubem George Oliven em seu artigo relata como se deu a legislação patrimonial no Brasil, com ênfase aos debates atuais sobre a definição dos bens imateriais. Regina Abreu menciona o programa criado pela UNESCO, intitulado “Tesouros humanos vivos”, que definiu como ação prioritária a valorização dos mestres em diferentes ofícios. No último capitulo Mário Chagas, para encerrar este bloco, trata os bens tangíveis e intangíveis, defendendo a ideia de preservar não apenas os bens materiais como também os bens imateriais.
 “Memória e narrativas nacionais”, o primeiro capitulo de Myrian S. dos Santos, a autora menciona a criação dos primeiros museus brasileiros cujos objetivos eram a exaltação das monarquias, ou seja, museus com caráter nacionalista. O texto de Mário Chagas enfatiza a memória política e política de memória no início da primeira república, onde o mesmo analisa a pintura histórica de Aurélio de Figueiredo, denominada “Compromisso Constitucional” de 1896.
 “Memórias e narrativas urbanas”, José Reginaldo Santos Gonçalves postula as relações entre os museus e os espaços urbanos. Para isso vai tratar de três conceitos básicos: narrador, narrativa e informação, relacionando-os com dois personagens típicos das metrópoles o flâneur e o “homem da multidão”, que juntos representam dois públicos bem distintos dentro do museu-narrativo e a flâneire. Todas essas correlações foram elaboradas para demonstrar as relações que existem entre visitante e a museologia. Já o texto de Vera Beatriz Siqueira, vai dar o exemplo de um museu inserido propositalmente em um local urbano privilegiado, onde a vista que se tinha de lá pudesse ser mais um “objeto museal” de sua coleção: o museu do açude / RJ. Na sequência, o artigo de Cláudia Cristina e Mesquita Garcia Dias também aborda aspectos da identidade carioca, através da criação do Museu de Imagem e do Som (MIS) ou Museu de Fronteira, no entanto um espaço propício para exaltar a cidade e ser memorialista, adequou-se a um caráter de regionalismo impar, através da negação do regional. 
 “Memória e etnicidade”, em seu primeiro artigo, de José Ribamar Bessa Freire, irá mencionar as experiências indígenas como forma de organizar a memória e revigorar a identidade dos índios: Museu Magüta e a Embaixada dos povos da floresta; duas grandes exposições Museu Amazônica e o Museu Paraense Emílio Goeldi e dois projetos Museu aberto do descobrimento e o Museu do índio de Brasília. No último texto desse eixo, de James Clifford, o autor destaca experiências de museus britânicos que evidenciam a cultura indígena de maneira a romper paradigmas de preconceitos. Além de exemplificar algumas exposições através de uma museografia contemporânea e inovadora.
Por fim, “Memória e reflexidade” contêm apenas o artigo de Luiz Fernando Dias Duarte, onde menciona o ensaio teórico a respeito de memória através de comparação de culturas e reflexões sobre a função que a memória exerce na sociedade.  
Através da análise do livro resenhado, concluímos a relevância que a obra possuí para assuntos relacionados ao histórico da preservação do patrimônio, às novas tendências patrimoniais, através de museus envolvendo diversas etnias, além de tratar de assuntos que estão em voga a respeito da salvaguarda de bens imateriais.


[1] Livro resenhado para o grupo de estudos: Patrimônio e Memória: casos e descasos.
[2] Integrantes do grupo de estudos: Patrimônio e Memória: casos e descasos.



Centro Univeristário Franciscano
Grupo de Estudos Memória e Patrimônio: Casos e Descasos
Franciele Roveda Maffi (Pós-Graduanda em Patrimônio Cultural e Identidades)

Os Museus Brasileiros: Uma Proposta A Ser Apreciada

SEGRE, Roberto. Museus Brasileiros= Brasilian Museums/ Roberto Segre; fotografias/ photos: Leonardo Finotti; versão em inglês/ English version: Sérgio Moraes- Rio de Janeiro -Viana & Mosley, 2010.

Falar, pensar ou até mesmo escrever sobre os museus durante a história da humanidade, parece ser uma temática que causa um certo estranhamento. O senso comum identifica os museus como espaços de lembranças, lugares que guardam coisas velhas e perdem-se ao longo do tempo. Essa ideia é mantida até a atualidade e é resquício de um passado, que perdura por anos, onde as mentalidades levam tempo para modificar-se. Neste sentido, os museus eram designados nos século XVI e XVII, como gabinetes de curiosidades em que se colecionavam uma multiplicidade de objetos raros e, sem muita expressão cultural. A ideia que propagava desses espaços de preservação da memória, eram de imensas construções edificadas, que tornavam-se grandes depósitos com um excessivo acúmulo de bens materiais.
Portanto, os conceitos pré-estabelecidos acerca dos espaços museológicos vêm se transformando, tanto por parte das pessoas que visitam, como dos profissionais que desempenham as atividades que visam a preservação. Cabe destacar, que a consciência de uma nova museologia (1960), não despontou de um momento para outro, existe uma trajetória de estudos e pesquisas, que rompem gradativamente com os antigos paradigmas acerca do que é realmente um museu atrativo e acolhedor. O que era apenas grandes prédios no início do século XX, instituições de representação da cultura burguesa e de cunho positivista, presentemente passa a ser espaço de sociabilidade, interatividade e construção do conhecimento.
Com implementação das políticas museológicas (2003), outras idéias foram e estão sendo fomentadas acerca das instituições, como o incentivo à publicações acadêmicas, o surgimento de cursos de graduação e pós-graduação na área, bem como projetos que visam a criação de museus que trazem á tona a questão do antigo, concomitante ao pós-moderno e inusitado. Para abordar essa temática, já explicitada em breves palavras, tomou-se como aporte a obra Os Museus Brasileiros de Roberto Segre, que enfatiza a diversidade cultural da nossa sociedade e que é manifestação das comunidades mais primitivas que habitaram o nosso país. Por sua vez, o autor traz ao leitor as contribuições que essas inúmeras etnias trouxeram para o território nacional, expressões de identidade de um povo que se unifica por sua multidiversidade, e que na atualidade podem ser visualizadas e apreciadas nas instituições museológicas espalhadas nos quatro cantos do Brasil. Partindo da obra mencionada acima, destaca-se a preocupação do autor em dedicar-se a escrita da temática os museus, em especial os brasileiros. Portanto, é compreensível a explicação dessa abordagem teórica, por parte do autor. No entanto, por ser um italiano, traz em seus escritos o olhar do estrangeiro europeu, onde apresenta as vivências dos grandes centros, como uma referência na releitura dos espaços culturais brasileiros. Além disso, destaca-se a formação acadêmica de Segre, professor renomado da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFRJ; consultor da Faculdade de Havana em Cuba e Doutor em planejamento regional e urbano pela UFRJ. Tem na sua trajetória uma vasta produção de obras que enriquecem o cenário arquitetônico do país, ligados principalmente as experiências de edificações que contrastam o obsoleto esquema de museu passivo, criando a compreensão de museu interativo.
Uma passagem que chama atenção ao dedicar-se a leitura dessa obra, é a metodologia que a constitui, a organização em artigos sobre os museus brasileiros, faz com que o leitor se apaixone pela proposta de conhecer os museus, e mais do isso apreciá-los.
As imagens fotográficas também tornam-se um ponto positivo e de suma importância, pois servem de referencial visual para compreender os museus, as fachadas, a arquitetura de interiores e a riquezas nos detalhes das exposições. O autor parte do principio da reestruturação de alguns museus brasileiros, que foram alojados em prédios que tinham alguma funcionabilidade em outros momentos da história, como é o caso do museu de Língua Portuguesa, situado na cidade de São Paulo. Um ponto que desperta interesse neste museu, é a estrutura física que abriga a exposição do acervo. Um lugar que remete a memória tanto individual quanto coletiva, pois através do prédio, visualiza a antiga estação ferroviária, conhecida por Estação da Luz de São Paulo. Já na parte interior, a exposição é alicerçada por uma museografia de caráter tecnológico, os aparelhos mais modernos e avançados possíveis, no que implica em equipamentos de audiovisual e comunicação. Outro ponto, de destaque para o Segre em seus escritos durante o livro, é estabelecer acentuadamente essa relação de manter a integridade daquilo que foi construído há séculos, contrastando com o contemporâneo e científico. O autor evidencia na sua obra, a concepção de que para construir o novo, não necessariamente precisa romper com o velho. Como acontecem com os centros de preservação histórica (os museus, arquivos, bibliotecas, casas de memória e prédios) acabam por ser esquecidos, porque perdem a importância para seu tempo. Encontrando soluções rápidas e momentâneas para esquecer o passado, com a destruição desses espaços, através da destruição, o descuidado e a falta de zelo por parte de quem os gerencia. Portanto, isso acontece porque ainda existe uma escassez de ações que matêm a integridade física e histórica desses centros. Então, essa literatura museológica vêm contribuir como um arcabouço teórico, para aqueles que estão à frente desses centros, fazendo colocar em prática a explicação de que os museus carecem de uma nova releitura expográfica, sem perder a essência que é por excelência a história.
Além dos itens apontados anteriormente, outro ponto que corroboro com o autor é a ênfase ao Museu do Pão, na serra gaúcha. Nesse aspecto Segre destaca vários pontos a serem considerados como primordiais ao preservar um bem cultural ou patrimônio material e imaterial. Começamos destacando a ideia de se preservar a fachada de um antigo moinho, que é símbolo de representatividade da economia do imigrante italiano, a produção do trigo que servia na fabricação dos pães e que alimentavam as famílias. Como esse espaço pode-se instigar a reflexão do visitante, partindo da ideia de preservar.  Manter a integridade do prédio significa relembrar o passado dos imigrantes e sua forma de sobrevivência. Segundo ponto de destaque é o envolvimento dos acadêmicos do curso de arquitetura da Universidade de Caxias do Sul, na reestruturação do prédio, mantendo a arquitetura vernácula e preservando a estrutura física, mais próxima a realidade na qual foi construída. E o terceiro aspecto, o salão de exposições e oficina de panificação, onde são colocadas as peças que faziam parte do trabalho cotidiano do imigrante e se ensina o visitante a fabricar o pão, relembrando como os antepassados ítalos, produziam a alimentação.
Ao me deparar com essa obra, e poder apreciá-la detalhadamente, através dos seus escritos, da exposição dos museus brasileiros e das ilustrações, destaco a grandeza de quem a escreve, mais do que isso a importância que essa produção científica vem a ter como referência para a nova museologia. Essa obra, no entanto, vêm ser um a pórtico para aqueles (as), que desconsideram o antigo, o velho, quando querem idealizar o novo, o contemporâneo. Os museus têm os resquícios do passado, porém não são apáticos ao tempo presente.